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Existem fracos e existem heróis!

Um dia, quase sem perceber, me caiu aos ouvidos uma frase que me acompanharia por muito tempo: “Existem fracos e existem heróis.” Naquele instante, confesso, ela me soou dura demais, grande demais para caber na minha vida comum. Passei dias, meses talvez, tentando entendê-la. A princípio, achei que falava de gente extraordinária, dessas que aparecem nos livros ou nos altares. Só mais tarde, depois de atravessar minhas próprias noites, fui percebendo que aquela frase falava de mim, de você, de todos nós. Era sobre a alma humana e suas batalhas silenciosas. E aí a vida  –  essa mestra exigente  –  começou a traduzir a frase por meio das próprias experiências. Porque ela não poupa ninguém. Cedo ou tarde, somos lançados no campo de batalha da existência: dores que nunca pedimos, perdas que rasgam, incertezas que nos tiram o chão, perguntas que ecoam sem resposta. E, justamente aí, no lugar mais vulnerável da alma, os dois caminhos da frase finalmente se revelam: o do fr...

O coração e a alma livre

Quando parei por um instante hoje pela manhã pensei sobre a necessidade de ter o coração e alma livre, no mesmo instante me lembrei das primeiras páginas de O Coração: uma análise da afetividade humana e divina,  de Dietrich von Hildebrand, onde ele descreve algo que mexe profundamente com quem lê com sinceridade: o coração é o centro vivo da pessoa, o lugar onde o afeto se torna linguagem, onde a resposta ao valor se torna chama e onde a vida moral encontra sua verdadeira altura. Ele afirma que os afetos não são impulsos cegos, mas movimentos conscientes da alma diante daquilo que reconhece como valioso. Enquanto lia, eu percebia que a verdadeira liberdade interior começa exatamente ali, onde o coração deixa de ser um campo de impulsos dispersos e passa a ser um santuário ordenado pelo Bem. É impossível não lembrar da súplica do salmista: "criai em mim um coração que seja puro dai-me de novo um espírito decidido" (Sl 51,10), porque só um coração assim pode ser livre para ama...

Oração de quem quer crescer sem deixar de ser filho

Há momentos em que me pego pensando se não deveria abandonar esse meu jeito de conservar um pequeno menino dentro de mim, e hoje foi um desses dias. Às vezes imagino que isso seja imaturidade, um resquício que a vida adulta já não admite. Mas quando deixo o coração falar mais alto do que a lógica, descubro que não é assim. Deus me fez assim, me deixou crescer assim, e assim desejo permanecer diante d’Ele. Não como quem foge da maturidade, mas como quem aprende a amar com firmeza sem perder a pureza do riso. Ser adulto, sim, com a seriedade de quem já conhece o peso das escolhas e o valor da responsabilidade. Mas também guardar um coração de criança que sabe confiar, sabe rir, sabe entregar-se aos braços do Pai e da Mãe do Céu como quem repousa num colo seguro. Há algo de santo nessa infância preservada: uma coragem que não se envergonha de ser pequena, uma liberdade que o mundo esqueceu. Sempre que me encontro com esse meu lado brincalhão, lembro a frase tantas vezes atribuída a São Fi...

Meu "último retiro"

Vamos lá, gostaria compartilhar com vocês um pouco do meu "último" retiro... Há caminhos que a gente percorre com os pés… e outros que só se percorrem quando o coração deixa de arrastar correntes e passa a caminhar livre. Na manhã do dia 20 de novembro subimos no ônibus rumo ao Ceará, especificamente a Quixadá, quando o ônibus serpenteava a serra rumo ao Santuário Rainha do Sertão, eu soltei para o irmão ao lado uma frase que saiu meio espontânea, meio antiga, daquelas que a gente só aprende quando a vida já bateu um pouco: “Não adianta subir o monte se não elevar a alma.” Ele riu, eu sorri de volta, e me disse é verdade! Por dentro eu sabia: aquele seria meu último retiro como seminarista. E quem chega ao último degrau carrega no peito uma mistura bonita de serenidade e despedida. Fui tranquilo, sem ansiedade, como quem entrega as rédeas e diz: “Senhor, conduz Tu.” O Santuário, lá no alto daquele monólito que rasga o céu de Quixadá, não é apenas uma construção: é quase um se...

Beleza e perfeição

A beleza e a perfeição do homem não estão no acabamento das linhas corporais, mas na espiritualização do corpo e na corporificação do espírito. O corpo nunca deve tornar-se independente da alma e do espírito. A beleza corporal jamais pode ser alcançada às custas da beleza mental; na falta desta, nada mais resta senão o cuidado e a aparência externa. Toda carne é como a erva… A erva murcha, a flor cai, quando o sopro de Adonai passa sobre elas (cf. Is 40,6). Tu envelhecerás! Diego Tales  02/04/2025

O tédio e "o demônio do meio-dia"

Ontem eu e um xará, outro Diego, estávamos sentados conversando. Ficamos no seminário neste final de semana, sem pastoral, e entre uma palavra e outra caiu aquele silêncio típico de fim de domingo. Senti-me quase forçado a dizer que estava entediado, como se o domingo exigisse alguma coisa de nós. Antes de falar, porém, parei por dentro: será que estou mesmo entediado, ou simplesmente não estou sabendo estar aqui? A frase brotou: “Diego, eu ia dizer que estava entediado… mas percebi que o tédio é não saber aproveitar o momento.” Ele ficou pensando, com aquele aceno de quem entende sem pressa. Comecei a refazer algumas leituras e pesquisas sobre o assunto. A palavra “tédio” vem do latim taedium : aborrecimento, desgosto, enfado. Mas quando mergulhamos na tradição cristã, vemos que existe algo mais profundo escondido atrás dessa sensação: a acédia . Nos antigos Padres, acédia não era só mau humor ou monotonia — era uma provação espiritual real, uma tentação que derruba o gosto pelas coi...

O tempo

Era noite, e não havia vento. Durante uma palestra sobre a esperança, fui tomado por pensamentos sobre o tempo. Peguei o celular e, enquanto os pensamentos fluíam, comecei a digitar... Perder tempo com o tempo, como quem perde a si para se achar. Tomar o tempo nas mãos, mesmo sabendo que ele escorre, silencioso, entre os dedos da alma. Brincar com o tempo, como criança que confia no eterno, sem pressa, sem medo do fim. Viver o momento do tempo, onde o instante toca o infinito. Olhar o tempo e senti-lo, como o vento que não se vê, mas passa. Respirar o tempo, como quem ora sem palavras. Ter cuidado com o tempo, pois é dom, e o dom pede zelo. E então me pergunto, em voz mansa: Quanto tempo de tempo eu tenho? O bastante para amar, talvez. Ou apenas o bastante para aprender que o tempo não é meu, é graça que me visita, e passa. Diego Tales  23/10/2025